
A Nossa Espera
Olivier está lutando com seus companheiros no trabalho contra as injustiças, mas uma noite sua esposa Laura deixa ele e os filhos nos 9 e 6 anos. Agora ele deve enfrentar outra luta e enfrentar suas novas responsabilidades. Ele consegue encontrar um novo equilÃbrio?
Por mais que traga um inÃcio instigante, A Nossa Espera passa ao espectador uma mensagem enganosa – ou ao menos não tão fiel ao que o filme se propõe a ser. O retrato seco e direto acerca do ambiente de trabalho em uma fábrica logo expõe o lado cruel do capitalismo, incapaz de reconhecer a dedicação e o histórico de funcionários em nome de uma eficácia que, muitas vezes, descarta pessoas com imensa facilidade. Não por acaso, o diretor Guillaume Senez situa esta história em pleno inverno, de forma que a frieza seja não apenas palpável, pela ausência de condições de trabalho adequadas, mas também no convÃvio entre chefes e subordinados, pautado muito mais por números e metas do que qualquer afetividade.
Dentre este cenário, está Olivier (Romain Duris, em boa atuação). Politizado e dedicado, ele defende os colegas de trabalho diante as injustiças do dia a dia e, muitas vezes, precisa lidar com o fracasso em tamanha batalha. Os 15 minutos iniciais apontam que A Nossa Espera será um filme profundamente idealista, deliberando sobre a complexa relação entre empregados e empregadores no mundo atual, mas não é bem este o objetivo do roteiro coescrito pelo diretor e Raphaëlle Desplechin. Isto porque, logo a seguir, a esposa de Olivier desaparece, sem deixar rastros.
Aos poucos, A Nossa Espera deixa de lado o ambiente corporativo para esmiuçar a vida pessoal deste homem tão engajado, agora precisando lidar sozinho com a criação de dois filhos pequenos e, também, a sensação intrÃnseca de abandono. É ao encampar seu tÃtulo que o longa-metragem assume uma complexidade que engloba do desprezo à raiva, do desespero à dependência, em busca de possÃveis soluções para seguir em frente a partir de uma dinâmica até então impensável dentro do núcleo familiar. Para tanto, Senez recorre bastante ao peso do silêncio como forma de ressaltar a dor Ãntima de seus personagens principais, abrindo mão de uma trilha sonora instrumental em nome de canções ocasionais, pontuadas aqui e ali. Os diálogos rÃspidos mais uma vez reaparecem, mas em contexto bem diferente do inÃcio desta história.
Por mais que tal mudança de tom seja um tanto quanto brusca dentro da narrativa, a condução desta nova realidade apresenta um desmoronamento pessoal e profissional de forma a construir uma nova realidade, calcada em outras necessidades. Este, no fim das contas, é o grande objetivo do longa-metragem: mais do que simplesmente apontar o dedo a algo que se discorda, A Nossa Espera ressalta que a vida não é binária, havendo uma variedade de fatores que podem (ou não) influenciar decisões, mesmo diante de crenças pessoais. “Há mais mistérios entre o céu e a terra do que supõe a nossa vã filosofia”, assim diria Shakespeare.
Bem dirigido na construção deste ambiente, A Nossa Espera é um bom filme que faz refletir sobre questões bastante próximas envolvendo a vida contemporânea. Com um desfecho potente e doloroso, merece destaque também pela simples e sábia lição sobre o valor da democracia.